PANORAMA DA SAÚDE BRASILEIRA

Ana Maria Malik FGV ; Ana Regina C. Vlainich IBGC ; Artur C. das Neves IBGC ;Paulo Marcos Senra Souza INLAGS

O Sistema Único de Saúde (SUS) instituído no Brasil pela Constituição de 1988 tornou-se um modelo para outros países. Entretanto, a falta de investimentos conjugada a uma governança complexa o impediram de atingir seu potencial, nos seus primeiros 30 anos.  O modelo de assistência atual é desenhado sobre a oferta de serviços disponíveis e não em função das necessidades da população. Ainda tem a visão tradicional de ser fortemente centrado em hospitais e no profissional médico e o papel do paciente ainda é passivo e reativo.

No SUS convivem dois subsistemas:  o público, com intermediação financeira por parte do Estado e o privado, que funciona com intermediação financeira privada (por vezes com subsídio público). O orçamento público, responsável pelas necessidades de saúde e assistência médica de todos os cidadãos brasileiros, é de 45% do total. Os demais 55% do orçamento são utilizados por cerca de 25% da população, beneficiária, de forma voluntária, de planos de saúde suplementar que se responsabilizam basicamente por assistência médica e uma parte de gasto direto por parte do cidadão, que compra produtos e serviços de saúde na medida da sua demanda.  Dos planos de saúde suplementar 80% são corporativos, adquiridos por empresas que, em situações econômicas adversas, tendem reduzir seus funcionários e consequentemente seus gastos com o benefício saúde, aumentando o contingente de população que depende exclusivamente do SUS ou de sua capacidade de gasto.

Tendo em vista que os recursos para a saúde sempre são insuficientes, frente a necessidades crescentes, é necessário trabalhar de maneira a otimizar a cadeia de valor do setor para todos os seus agentes, de forma a garantir a possibilidade de reinvestimentos em todos os seus elos. Em tempos de pandemia tem-se verificado superlotação das estruturas públicas, por vezes ineficientes, e a  ociosidade de unidades privadas. Seria possível pensar no compartilhamento da capacidade instalada, que beneficiaria desde as organizações da saúde, que utilizariam melhor os seus recursos, até os cidadãos que receberiam melhora no seu atendimento. O processo de compartilhamento deveria ser administrado por critérios regidos pela boa governança corporativa, com vistas a buscar o ótimo para as partes constituintes.

Cada vez mais todos os envolvidos reconhecem que o agente principal do sistema de saúde é o cidadão, seja ele o paciente, o cliente, o beneficiário. Em momento de pandemia, isso se torna inquestionável.  No entanto, o modelo tradicional da saúde ainda é fragmentado, privilegiando os prestadores, operaodoras e os fabricantes em detrimento dos usuários.  Não é tarefa fácil entender o comportamento e as necessidades do consumidor atual de saúde no Brasil. A popularização do uso de celulares e computadores, independente da classe econômico social dos cidadãos, aumentou a informação (por vezes equivocada) do que seria a qualidade dos serviços a que eles têm direito. 

Os gestores da saúde no século XXI precisam identificar e entender este novo perfil de cliente, como centro e protagonista, e implantar as mudanças necessárias principalmente na forma de se comunicar com ele. Nesse caso, nada mais natural do que reconhecer que a informação é propriedade do cidadão. Estas informações devem ser integradas e de fácil acesso, oportunas e fidedignas.  O cliente tem o direito de conhecer o serviço antes de adquiri-lo ou de utilizá-lo, o que torna inadequada a falta de transparência hoje existente, tanto no público quanto no privado, tanto nos prestadores quanto nos financiadores. 

Duas são as mudanças que aparecem como as mais próximas de ocorrer:  maior disponibilidade ao público de informações  comparativas sobre prestadores de serviços, fornecedores, distribuidores de produtos e tecnologias etc  e a utilização de serviços à distância como consultas. Mais distante, mas em futuro próximo parece estar um prontuário eletrônico integrado e conjugado, centrado no cidadão,  com bancos de dados centralizados e que, utilizando Inteligência Artificial (IA), conseguirão coordenar os fluxos das informações da cadeia de valor.

Este novo tempo abre espaço para fortes investimentos em conscientização sanitária do indivíduos (health literacy). A prioridade nos fatores de prevenção contra a doença e promoção da saúde, os chamados determinantes sociais pode vir a atenuar o foco na doença como efeito.  Com isto talvez seja possível mudar a perspectiva na  respostas à pergunta “em sua opinião, qual é o motivo mais importante para se ter plano de saúde? ”, que usualmente tem sido: “para cobrir os custos, em geral hospitalares, associados as doenças graves ou aos casos de internação decorrentes de acidentes”, o que traduzido mostra que está sendo comprado um plano de doença e não de saúde.

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